Atualidades II- Brasil é o maior consumidor mundial
Essas substâncias não estão presentes apenas em alimentos in natura como frutas, legumes e verduras, mas também em produtos alimentícios industrializados, que têm como ingredientes o trigo, o milho e a soja, por exemplo. Elas ainda podem estar presentes nas carnes e leites de animais que se alimentam de ração com traços de agrotóxicos e até no leite materno.
Em abril de 2015, o Instituto Nacional de Câncer (Inca) divulgou um relatório sobre o uso de agrotóxicos nas lavouras do país e seus impactos sob o meio ambiente e à saúde. Segundo o instituto, o Brasil é o maior consumidor mundial de agrotóxicos. O país é um dos maiores produtores agrícolas do mundo e utiliza agrotóxicos em larga escala. Para o agricultor, os agrotóxicos são recursos para combater as pragas, controlar o aparecimento de doenças e aumentar a produção. Em dez anos, a venda de pesticidas no mercado agrícola brasileiro aumentou de R$ 6 bilhões para R$ 26 bilhões. Atualmente, o país ultrapassou a marca de 1 milhão de toneladas, o que equivale a um consumo médio de 5,2 kg de agrotóxico ao ano por pessoa. Além de danos ambientais, a equipe do Inca alerta sobre os riscos de doenças como o câncer. Segundo o relatório, o que faz um alimento saudável é sua composição. Os agrotóxicos na alimentação podem alterar o funcionamento normal das células do corpo humano, causando mutações e maior probabilidade do desenvolvimento de doenças no futuro. No Brasil, cerca de 450 substâncias são autorizadas para uso na agricultura. O Inca alerta ainda sobre o uso de muitos princípios ativos que já foram banidos em outros países. Dos 50 produtos mais utilizados na agricultura brasileira, 22 são proibidos na União Europeia. Em 2014, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) fez um levantamento com amostras de alimentos em todo o país. No estudo, 25% apresentavam resíduos de agrotóxicos acima do permitido. O uso indiscriminado e abusivo desses produtos e a falta de fiscalização em relação a níveis seguros de substâncias aumenta o risco para a saúde dos brasileiros. Para o Inca, antes de liberar a venda de defensivos agrícolas, o Brasil precisa de pesquisas sobre os potenciais efeitos e riscos à saúde humana decorrentes da exposição aos químicos, particularmente sua relação com determinados tipos de câncer. A relação entre o consumo de agrotóxicos e o desenvolvimento de câncer e outras doenças já é reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Uma pesquisa publicada na revista científica “The Lancet”, em março deste ano, pela Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer (Iarc), classifica cinco agrotóxicos como prováveis agentes cancerígenos: tetraclorvinfós, parationa, malationa, diazinona e o glifosato. Esses agentes são liberados no Brasil, mas apenas o glifosato possui registro de produto. Em abril de 2015, a Anvisa anunciou que vai revisar a liberação do uso do produto no país. Em 2012, a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrascp) divulgou um relatório com estudos que comprovam que agrotóxicos fazem mal à saúde e provocam efeitos nocivos com impactos sobre a saúde pública e a segurança alimentar e nutricional da população. Segundo o relatório, as intoxicações agudas por agrotóxicos afetam principalmente os trabalhadores rurais que entram em contato com doses altas desses químicos via pele ou pelos pulmões. Eles podem apresentar problemas como irritação da pele e olhos, coceira, cólicas, vômitos, diarreias, espasmos, dificuldades respiratórias, convulsões, desregulação endócrina e até a morte. Já as intoxicações crônicas podem afetar toda a população que consome os alimentos com resíduos de agrotóxicos. Os efeitos adversos decorrentes da exposição crônica aos agrotóxicos podem levar vários anos para aparecer, dificultando a correlação com o agente. Dentre os efeitos associados à exposição crônica a ingredientes ativos de agrotóxicos podem ser citados infertilidade, impotência, abortos, malformações, neurotoxicidade, desregulação hormonal, efeitos sobre o sistema imunológico e câncer.Um fator que colaborou para colocar o Brasil no topo do ranking de consumo foi a liberação do uso de sementes transgênicas (geneticamente modificadas) no país. O cultivo dessas sementes exige o uso de grande quantidade de agrotóxicos. Atualmente, o Brasil é o segundo maior produtor mundial de transgênicos, atrás apenas dos Estados Unidos. São mais de 42 milhões de hectares de áreas plantadas no país com esse tipo de semente, principalmente na produção de soja e milho. Os agrotóxicos também contaminam o meio ambiente. A pulverização dos químicos acontece em sua maior parte por avião, contaminando o ar da região e áreas próximas, como cidades vizinhas que podem receber o químico levado pelo vento. Isso afeta animais como abelhas e insetos, que são importantes para o equilíbrio do ecossistema. No solo, os químicos podem influenciar na falta de compostos orgânicos e microorganismos e podem contaminar a água de córregos, rios, lençóis freáticos ou aquíferos. Alimentos orgânicos são aqueles que não usam fertilizantes sintéticos, agrotóxicos ou pesticidas em seu método de cultivo. Os solos são enriquecidos com adubos naturais tornando esse tipo de alimento mais saudável e nutritivo. Apesar dos benefícios, o alimento orgânico é mais caro no Brasil, pois a produção é de baixa escala e a maior parte é proveniente da agricultura familiar, o que impacta no custo de distribuição e comercialização. O uso de agrotóxicos se intensificou no Brasil na década de 1970, quando o governo buscou fomentar a produção de agrotóxicos para estimular o crescimento do agronegócio e garantir alta eficiência produtiva. Nesta época, o financiamento bancário para compra de sementes era atrelada ao adubo e o agrotóxico. Atualmente, a indústria química de defensivos agrícolas é isenta de impostos. Uma das soluções para reduzir o uso dessas substâncias seria investir em projetos de larga escala de agroecologia, um meio ecologicamente correto e viável de se manejar e cultivar as plantas. Neste tipo de plantio, podem ser usadas técnicas conhecidas por engenheiros agrônomos e que não utilizam químicos, como sistemas de irrigação eficiente, biofertilizantes que agem como inseticidas biológicos, alternância de plantações e rotação de espécies, adubação com restos orgânicos, compostagem, entre outros. Países como a França, o maior produtor agrícola da Europa, já estão desenhando planos para a promoção de um modelo agroecológico, que concilie os níveis de produtividade e o impacto ambiental. Por Carolina Cunha
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